sexta-feira, 21 de maio de 2010

SALESIANIDADE

O Sistema Preventivo na educação dos jovens

P. Antenor de Andrade Silva, sdb.

Como surgiu o SPS. A vida numa escola salesiana. Um modo de estar diferente na escola. O diretor salesiano. Os passeios. A grande preocupação das férias. As festas escolares, os teatros, os recreios. A boa noite, a palavrinha ao ouvido. Pedagogia preventiva, comunicação e ecologia. O professor salesiano e os coordenadores leigos. Recordações confidenciais aos Diretores (1863). Conclusão.

O Sistema Salesiano de Educação envolve todas as situações educativas e re-educativas. D. Bosco o realizou, não apenas no oratório, no internato, orfanato, colégio, escola, associação ou grupo, mas também em seus encontros particulares com jovens e em sua obra publicitária. Os destinatários são homens e mulheres de todas as idades, condições, comportamentos e classes sociais. A aplicação é possível tanto para a educação individual, personalizada, como para a educação de multidões.
A figura central do Sistema Preventivo Salesiano [SPS], também chamado Sistema Preventivo de D. Bosco é o próprio D. Bosco. Trata-se de uma metodologia pedagógica desenvolvida e atuada universalmente pela Congregação Salesiana. Fundamenta-se na experiência educativa do santo de Valdocco, por ele vivida no meio dos jovens de Turim.
D. Bosco não tolerava o sistema repressivo reinante na Europa do século XIX e ainda utilizado em alguns países. O método bosquiano de educar teve em sua origem na influência de alguns fenômenos visionários, os famosos “sonhos”. Alguns métodos pedagógicos se inspiraram no S. Preventivo Salesiano, hoje objeto de estudos em diversas universidades. Sinteticamente este Sistema orienta o educador a “prevenir” o educando para as dificuldades, os problemas que ele poderá enfrentar e o orienta para construir um futuro melhor para a vida.

«A dimensão preventiva está no fato de prever. Uma atitude responsável de prospecção em harmonia com a criação no sentido de um desenvolvimento persistente e eficaz de potenciar a vida futura. “O educando é capacitado a agir e a dar forma ao futuro na vivência de um presente antecipador».

• Como surgiu o Sistema Preventivo Salesiano

O SPS não foi forjado em um escritório, nem tampouco nasceu de uma literatura pedagógica. Se quisermos entendê-lo, devemos procura-lo na mesma pessoa de D. Bosco, em sua biografia. Assim veremos que o educador de Turim foi um dos expoentes mais destacados do seu século, também na prática pedagógica. Concluiremos que sua atuação teve grandes ressonâncias no desenvolvimento da pedagogia do século XX.
A convivência diária com os moços na Turim da segunda metade do século XIX deu ocasião à prática do SPS. Através do espírito de observação do jovem padre, de seu amor pelos jovens, de sua perspicácia e, sobretudo, como já notamos, o reconhecimento e a prática de certas orientações sobrenaturais o visionário inquieto a moldou e ofereceu aos educadores um modo diferente de tratar com os educandos e conduzi-los a uma vida melhor. Para ele sua proposta educacional iria oferecer uma resposta adequada às necessidades de suas pessoas e seu tempo.
Outras fontes, onde podemos conhecer os princípios do SPS, além das Memórias Biográficas de D. Bosco e da Carta de Roma são As Memórias do Oratório (de 1815 a 1855), onde são descritas entre outras informações as atividades pastorais e educativas realizadas naquele ambiente. Há também um pequeno escrito de muito valor intitulado O Sistema Preventivo na Educação da Juventude (1877).
Os historiadores concluem que D. Bosco não deixou um corpus metódico que nos oferecesse um estudo ordenado do SPS. Os salesianos teriam que arregaçar as mangas e realizarem esta tarefa.

O Sistema Repressivo substituído pelo SPS é descrito por ele mesmo nos Regulamentos para as Casas da Sociedade de São Francisco de Sales. A severidade do educador repressivo é criticada e rechaçada como algo que não se coaduna com a verdadeira educação. A ameaça, a distância, o castigo físico são armas constantes e normais do SR, ao contrário da razão, da religião e da familiaridade. Além disso, este sistema não garante uma real formação para a vida do educando.

«Pode impedir uma desordem, mas dificilmente melhorará os culpados. Diz a experiência que os jovens não esquecem os castigos recebidos, e geralmente conservam ressentimento acompanhado do desejo de sacudir o jugo e até de tirar vingança.» ...«O Sistema Preventivo pelo contrário, granjeia a amizade do menino que vê no assistente (educador) um benfeitor que o adverte, quer fazê-lo bom, livrá-lo de dissabores, castigos e desonra».

Na época em que D. Bosco escrevia os princípios do SPS, o SR era conhecido e aplicado como essencial na educação européia. Costumava-se dizer que a letra entra com sangue. Como já afirmamos em muitos lugares o SR continua adotado não só em países em desenvolvimento, mas também em sociedades do primeiro mundo. Em 2006 a BBC falava em 109 nações que haviam abolido os castigos físicos na escola. E os demais países?

• Um modo de estar diferente na escola

A pedagogia salesiana prega um modo de estar diferente na escola e no pátio, pois o ambiente salesiano com seus educadores deve ser uma casa que acolhe o jovem para fazê-lo feliz.
A dignidade, o respeito pelo educando, a dedicação obrigam o educador a uma constante reflexão sobre seu papel, sua missão, não só, mas sobre os conceitos do ensino e da educação. A educação segundo o SPS é uma viagem, uma aventura em que educador e educando embarcam juntos. De ambos vai depender o final feliz da formidável tarefa, mas, sobretudo do professor.
Nesta caminhada a assistência amiga, diaconal é um fator importante para a formação, para apoiar o jovem. Assim o educador com os jovens,

« em interação, treinam as competências emocionais, intelectuais, espirituais e práticas. Trata-se de cultivar o ser humano na sua totalidade num ambiente de desenvolvimento natural espontâneo e global. O pedagogo D. Bosco supera o pensar seletivo, causal e apelativo – moral. No centro de sua pedagogia está a pessoa, o jovem todo, aceito tal como ele é. Trata-se de acordar os seus talentos e despertá-los para a metamorfose. A educação não pode estar alheia à disciplina à persistência, à vontade e à autoconsciência Uma vez descobertos os talentos próprios trata-se de despertar alegria no que se faz. Trabalho e alegria andam juntos. D. Bosco convencia porque tinha uma vivência, uma visão de homem e de sociedade».

Note-se que D. Bosco com seu sistema não visava apenas o profissionalismo do educando, seu carreirismo, seu bem estar material ou sua segurança física. Essa lógica fomentaria prisioneiros do sistema, cujos cárceres em seu tempo abarrotados, continuam apresentando nos nossos dias os mesmos filmes. Por que as constantes irracionalidades, as violências, as insatisfações universais continuam acontecendo e o mundo desejando e precisando cada vez mais de paz? Creio que um dos motivos é um sistema de educação estático e sem criatividade que não ensina o homem a viver. Que não é capaz de levar o único animal racional a usar de sua racionalidade para seu bem, para uma família, cuja felicidade já poderia, em parte, ser experimentada abaixo dos céus.
As ideologias são o esconderijo da alienação. A realidade cede lugar às idéias, idéias e estratégias de adaptação e imitação, nem sempre positivas e construtivas.
O que os santos nos ensinam - e D. Bosco era um grande mestre nesse aspecto - , quando nos aconselham a “vivermos na presença de Deus”, é a nos acostumarmos a viver o momento presente, tornando-o criativo e gratificante. Seu sistema tentava incutir esta verdade nos jovens de seu Oratório.

«Na presença de Deus não há idéias nem normas, extingue-se o passado e o futuro, o agora é tudo, é acontecer para lá de qualquer estrutura, na relação total de qualquer orientação: o amor é ágape».

Ele queria, sobretudo a felicidade a realização pessoal dos jovens. Programas e notas não lhe interessavam tanto, não desenvolvem uma verdadeira personalidade, podendo criar robores que se adéquam a certos tipos de sociedades ou instituições. O aluno tem que se acostumar a refletir, a pensar, a conscientizar as razões de suas atitudes.

Um saber apenas funcionalista que vise tão somente o cultivo do intelecto torna-se unilateral, redutor, materialista. O jovem deve descobrir que há outros mundos além das simples cortinas do pensamento. Deus nos fez a sua imagem e semelhança com capacidades de galgarmos os degraus do infinito. O educador deve ajudar o aluno a ir além dos palcos do intelecto. Não alcançam por si sós as complexas e fantásticas realidades dos mundos exteriores e da introspecção. Podemos parafrasear a expressão paulina: vós sóis os templos de Deus... A escola deve levar à maravilhosa descoberta de que do encontro do mestre com o aluno se chega a Deus. Ela deverá ser este templo e os educadores seus sacerdotes. Possível? Tentemos.
O acontecer e o observar são mais importantes que o saber. Deste pode-se responder a um processo de responsabilidade global capaz de ver além das coisas e das ilusões. Nesta metánoia está um dos grandes papéis do educador que deve ser companheiro do educando, colocar-se ao seu lado. Presencia e presencializa com ele a sua resposta ao universo e à humanidade. Em ambos se encontram lado a lado criação e humanidade. Por isso é essencial a relação de simpatia, de amorevolezza com o jovem. No SPS os dois devem viver empaticamente. Não é suficientemente amar os jovens, eles têm que perceber este amor.

Neste processo a aprendizagem torna-se uma recreação, e acontecerá num ambiente de carinho e mútua confiança. Daí poderá nascer uma rica experiência espiritual e comum que o educador deve descobrir e carrear para o bem de seu discípulo. Neste particular e numa feliz observação, o professor Antônio da Cunha afirma:

«Educar torna-se a arte de aprender, de observar e viver a vida toda, ajudar a ser compreendido e a compreender, num despertar da consciência humana e do mundo. Educar é aprender a descobrir-se descobrindo, num processo dinâmico e contínuo de ipseidade-alteridade num triálogo eu-tu-nós, à imagem da fórmula da realidade trinitária».

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